14 abril 2008

Em busca da gata perdida

Apesar de não podermos voltar atrás no tempo, podemos sempre retomar algumas das actividades que nos davam prazer no passado. Seguindo esta linha de raciocínio, resolvi acompanhar os meus pais até à sua pequena quinta no Ribatejo, para passar dois dias no campo, enquanto fazia um trabalho voluntário com aves nessa região. Depois de um fim-de-semana de trabalho árduo (quem corre por gosto sempre se cansa um bocado...), foi com agrado que vi chegar as quatro da tarde de domingo, hora que marcava o início dos preparativos do nosso regresso a casa.

Eram, então, quatro da tarde quando dei com a gata siamesa dos meus pais presa na sua caixa, a miar insistentemente pela liberdade. Abri-lhe a porta, comovido, ignorando as técnicas manipuladoras do felino. A minha mãe ainda gritou “Nãaaaaaoooooo!”, correndo em câmara lenta para ela, na vã esperança de a apanhar, mas ela foi mais rápida, deixando apenas meia dúzia de pêlos atrás de si. Foi só quando vi a minha mãe a revirar a casa de uma ponta à outra que me apercebi do que tinha feito. Ao que parece, esta gata temperamental não gosta de viajar de carro, tendo por hábito esconder-se quando vê as malas a serem arrumadas, antes do famigerado regresso a casa. (Ou seja, o animal é irracional, mas não é nada parvo...). Para evitar horas infindáveis em busca dela, os meus pais têm por hábito encerrá-la na jaula, antes de começarem a arrumar as coisas.

Apercebendo-me, então, do meu erro crasso, lá fui oferecer os meus préstimos à minha mãe, uma verdadeira especialista na arte de encontrar uma gata que não quer ser encontrada. A técnica de busca e salvamento, apurada ao longo de muitos domingos de angústia, consiste em passar a pente fino uma divisão da casa de cada vez, fechando a porta dessa divisão de modo a garantir que essa Houdini peluda não possa mudar de esconderijo. Só que a porta da rua tinha estado aberta logo depois do seu desaparecimento, o que significava que ela poderia estar em cerca de 234 576 de sítios da pequena-grande quinta. Procurámos por todo o lado, dentro e fora de casa. Olhámos para dentro de poços, para o cimo de árvores, para as mandíbulas dos cães das redondezas. Chamámos o nome dela, usando todas as entoações possíveis. Oferecemos comida, água, imitámos ratos e passarinhos feridos. Nada. Ela não aparecia. O meu pai sugeriu sairmos com o carro, para que ela pensasse que nós nos tínhamos ido embora e saísse do seu esconderijo. Eu pensei que ele estivesse a gozar, mas esta manobra já tinha dado frutos no passado. Portanto, lá fomos dar uma volta ao quarteirão de carro, enquanto a minha mãe esperava que a gata aparecesse. Só que o bicho já não se deixa enganar e, quando voltámos, continuava a monte. Sentei-me no sofá e liguei a televisão, cansado do trabalho e desta busca infrutífera. Pensei que teria de me levantar cedo no dia seguinte e perguntei-me quando é que a Princesinha decidiria terminar este jogo das escondidas. Passado pouco tempo, ela apareceu finalmente, com ar de sono, a espreguiçar-se e a miar pelo jantar. Eu fiquei radiante por saber que as nossas vozes chamando desesperadamente o seu nome não a tinha impedido de dormir uma boa sesta. Ainda disse aos meus pais que arroz de gato é parecido com arroz de coelho, mas eles limitaram-se a repreendê-la com um “Ai, ai, ai, sua marota!”.

Ai, ai, ai, sua marota? Então esse bicho possuído pelo Demónio faz-nos perder horas e horas e só recebe isso? Então e o puxão de orelhas? E o castigo? Isto, no meu tempo, não era assim...

4 Comments:

Blogger c. said...

É verdade...tenho de me revoltar contigo: já não se fazem pais como antigamente! Onde estão os castigos? os "agora comes a sopa toda" ou os "só por causa disso hoje não vais andar de bicla"...não se faz!
Eu se estivesse no teu lugar, agindo como uma espécie de irmão mais velho da velhaca da gata, havia de lhe fazer a vida negra ;) havia de passar umas belas semanas a leite de soja que era para aprender!!!

6:39 da tarde  
Blogger Bruno Miguel Pinto said...

Oi, C. A gata é dos meus pais, é difícil pô-la castigá-la porque não vive comigo. De qualquer modo, estou a lembrar-me que os meus pais me pediram para ficar com ela uns dias durante o Verão... :)

7:14 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Eu tenho o mesmíssimo problema com a minha gata: Quando vamos para férias, chegada a altura das arrumações das malas no carro, ela desaparece sem deixar qualquer rasto. Incrível!

6:26 da tarde  
Blogger Bruno Miguel Pinto said...

Olá, BC. Explicaram-me recentemente que, em geral, os gatos não gostam de viajar. Por isso se põem com estes jogos das escondidas quando se apercebem que estão prestes a irem de viagem.

11:47 da manhã  

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